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“Porém se a gente vive a sonhar, com alguém que se deseja rever, saudade, entonce, aí é ruim, eu tiro isso de mim que vivo doido a sofrer”. Os versos cantados por Luiz Gonzaga são realidade na vida de milhares de brasileiros que vivem nos Estados Unidos sem documentos. “O que mais dói é não poder ir e vir. É a saudade”, diz Geralda Diniz de Sá, em Atlanta há 16 anos e sem documentação legal.

Embora o governo brasileiro não tenha dados precisos sobre o número de imigrantes que vivem nos Estados Unidos, o Ministério das Relações Exteriores, calcula que existam de 1,3 milhão a 1,4 milhão de brasileiros residentes no país. No Dia do Imigrante, lembrado hoje (25), a Agência Brasil publica uma série de matérias para mostrar um pouco da realidade dos brasileiros nos Estados Unidos.

Geralda deixou Goiânia em 1998 após se divorciar do marido. “Eu era professora de história na rede pública, deixei meus filhos e vim para cá porque queria dar um novo rumo para minha vida”, contou à Agência Brasil. Hoje, aos 57 anos, ela trabalha como house cleaner – nome dado às diaristas nos Estados Unidos.

Na busca de um “novo rumo”, Geralda ajudou a pagar os estudos dos filhos, comprou casa nos Estados Unidos e no Brasil e diz que não tem do que reclamar, do ponto de vista financeiro e de qualidade de vida. “Mesmo sem documentos, eu tenho carteira de motorista, tenho carro, tenho casa e meus filhos estão todos encaminhados. Um dos meus filhos fez direito e agora é advogado”, diz, orgulhosa.

Nos 16 anos vividos em Atlanta, Geralda disse que acumulou experiência e aprendizado, mas lamenta não poder ir ao Brasil visitar a mãe que tem 96 anos. “Sinto falta da minha mãezinha e quero revê-la o mais rápido possível. Mas se vou agora, posso não conseguir passar pela imigração novamente”, diz.

A trajetória vivida por Geralda e as dificuldades que enfrenta há mais de uma década são as mesmas para quem chega atualmente. Há cerca de dois meses, Geralda acolheu em sua casa a trabalhadora doméstica Jandira Antônia Lopez, 44 anos, há um ano e meio nos Estados Unidos.

Jandira saiu do Brasil para trabalhar na casa de uma antiga patroa de Brasília, mas o contrato de trabalho não foi cumprido e ela resolveu deixar o emprego. “A minha ex-patroa não cumpriu o que prometeu sobre salário, não me deixava sair de casa e acabei presa numa condição que não queria”, contou.

A brasiliense entrou nos Estados Unidos com o visto solicitado pela antiga empregadora, mas resolveu continuar. “Eu consegui renovar meu visto por três meses, mas agora eu pretendo ficar mais tempo, só que sem visto.”

Divorciada, Jandira conta que o dinheiro ajuda a manter a família no Brasil. “Meu filho mais velho faz faculdade e o outro estuda para concurso público. Eu ajudo pagando cursinho. Também ajudo meus parentes”, disse.

Ela diz que também quer investir em si mesma e estudar inglês. Para isso, conta com a ajuda e o suporte emocional da amiga. “A Geralda já passou por tudo o que estou passando, sobre saudade e sobre as dificuldades de quando a gente chega. Eu olho para ela e vejo que é possível.”

Jandira diz ter consciência do impacto da decisão de ficar. “Eu vejo as pessoas que foram ficando aqui. Você vai ficando longe e distante, mas o dinheiro que você ganha e o bem que proporciona passa a ser importante para a família que fica e você vai aceitando a condição de não poder sair daqui.”

A dificuldade de ir e vir também aparece nas estatísticas. Uma pesquisa publicada no portal Diga aí – plataforma digital criada por brasileiros que vivem em diferentes partes do mundo com o objetivo de formar uma base de dados das comunidades de imigrantes – mostra que 72% dos brasileiros que moram em Massachusetts (segunda maior comunidade brasileira) nunca visitaram o Brasil desde que saíram do país.

“Dificilmente o imigrante sem documentos arrisca deixar os Estados Unidos e a vida que construiu aqui e lá [no Brasil] – o apoio que proporciona à família – se houver um risco de não poder passar novamente”, comenta o pesquisador Álvaro Lima.

Além disso, os imigrantes que não têm documento convivem com o medo da deportação. Álvaro lembra que há fases em que o governo afrouxa as leis e o controle e fases em que “aperta mais”. Também há mudanças na conduta adotada em cada uma das regiões. Na área metropolitana de Atlanta, por exemplo, a polícia não deporta um imigrante encontrado em blitzde trânsito. Em condados vizinhos, entretanto, há vários relatos de deportações.

“Eu tenho medo de ir a alguns lugares, porque a gente fica sabendo que a polícia está fazendoblitz e se você não tem documento te mandam de volta”, disse um pedreiro brasileiro que vive ilegalmente nos Estados Unidos desde 2001 e pediu para que o nome não fosse publicado.

Leandra Felipe – Correspondente da Agência Brasil/EBC